Idoso Empreendedor e o impacto das oficinas de smartphone


24/01/2018 - Atualizado em 02/02/2018 - 450 visualizações

Transformar vidas é o resultado das ações cotidianas realizadas nas Unidades do Sesc em Santa Catarina.

O projeto Idoso Empreendedor provoca verdadeiras transformações nas vidas dos participantes, uma vez que proporciona a inclusão digital do público idoso, pouco familiarizado com as novas tecnologias.

No Sesc em São Bento do Sul, como parte das atividades do projeto, foi oferecida a oficina de smartphone, para auxiliar os participantes no uso desses dispositivos, facilitando sua comunicação com familiares e amigos.

Como veremos no relato a seguir, a atividade provocou uma verdadeira revolução na vida da senhora Elisabeth Becker, de 66 anos e de seus colegas de turma. Ela narra as dificuldades que sofria na relação com as novas tecnologias, e como as aulas no projeto Idoso Empreendedor ajudaram a virar a página e criar novas conexões, na vida real e na virtual. Confira:

"Da Jaula de Tigres ao Smartphone"

– por Elisabeth Becker

Passei as últimas duas décadas da minha vida enfrentando um território aos meus olhos mais perigoso que entrar em uma jaula de tigres: a presença da informatização as nossas vidas. Minha idade já possibilitara passar por algumas revoluções, mas talvez a mais crítica ocorreu quando o meu trabalho como professora tornou-se inviável sem a presença de alguns recursos tecnológicos em sala de aula. Honestamente, a minha sensação foi a de ser pessoalmente invadida, de viver um ataque contínuo contra aquele diálogo pessoal direto, o olho no olho essencial ao saudável relacionamento professor-aluno. Até nas reuniões de família aquela “maquineta” aparecia sendo dedilhada velozmente pelos adolescentes, substituindo os nossos diálogos, a meu ver.

Cheguei a aprender algumas atividades com o meu notebook e usava eventualmente um celular como telefone. Mas todos os meus amigos reclamavam que ele vivia mais desligado do que a própria dona. Pressionada por todos os lados, em dezembro de 2016 finalmente adquiri um smartphone, como se fosse uma presença indesejável na minha vida. Pedi ajuda aos experts da família e logo a sua velocidade e impaciência perante a minha lentidão me fizeram “aposentar” precocemente a “maquineta”, tendo aprendido apenas a ligar e desligar.

Assim o meu smartphone “dormiu” em sua caixa até Julho. Até que decidi não perder mais o meu tempo precioso adiando experiências de vida depois de 66 anos e assim, as dificuldades precisavam ser encaradas criativamente, ou seja, tinha que topar o desafio de entrar na era da informatização. Coincidentemente (sincronicidades existem…) li no jornal sobre o início de um curso de informática para idosos no Sesc e, imediatamente, me matriculei.

Começava aí uma jornada que tinha como ponto de encontro uma sala arejada, agradável, com 9 computadores e cadeiras muito confortáveis para as minha costas sexagenárias. E o mais importante: nossa jovem professora Marcia! (“Poderia ser até minha neta” pensei rabugentamente). De imediato ela conseguiu quebrar o gelo entre todos os integrantes do grupo, além de quebrar arestas de horários, expectativas e, principalmente, da multiplicidade de graus de familiaridade que os integrantes tinham com a informática. Nossos comentários borbulhavam: “Meu neto já me mostrou como faz, mas não tem paciência de repetir…”; “Meu filho tentou me ensinar e tirar minhas dúvidas, mas ele está muito avançado e não entendo as explicações…”.

E eu pensando: “Sem filhos, sem netos, só espero que essa professora ao menos me motive minimamente a mexer com esta tal “maquineta” poderosa e assustadora”. No fundo eu me lembrava de todas as tentativas que só me frustraram pela sensação de desamparo e até raiva, em observar a facilidade e intimidade que outras pessoas tinham com os seus smartphones enquanto eu ficava cada vez mais para trás.

Para minha surpresa, rapidamente estávamos brincando nos computadores, desenhando, usando trechos de poesias para recortar e colar, experimentando tranquilamente construir uma tabela. Lembrando que eu sou da época em que gráficos e tabelas eram elaborados em papel quadriculado, quase explodi de alegria vendo a facilidade atual. A cada descoberta essa alegria era renovada, pois tudo era explicado calmamente, em nosso ritmo, com direito a tantas recapitulações e respostas objetivamente individualizadas às nossas perguntas.

Nossas expectativas maiores concentravam-se, entretanto, em aprender a lidar com nossos smartphones, para o que muitas das perguntas se encaminhavam. Com a tranqüilidade habitual, Marcia nos pediu que trouxéssemos nossos aparelhos para a próxima aula e assim nos instruiu com os elementos básicos.

A essa altura já funcionávamos como um grupo, desde o direito a uma escala para trazer o lanche da aula, até trocas de pequenas confidências pessoais e, principalmente, muita discussão de assuntos cotidianos temperados com boas gargalhadas. Tudo sob a coordenação firme e doce da professora que já conquistara a confiança de todo grupo, por ela criado e nomeado no WhatsApp como “ Amigos da Caponata”. Trocas de mensagens, fotos, receitas, anedotas, vídeos, tudo enfim que o WhatsApp possibilita passaram a enriquecer o nosso cotidiano. Descobertas de como usar mapas, de como navegar no Google, de como atualizar o nosso perfil nos estimulavam e motivavam a cada aula, até que a proximidade do final de ano nos trouxe os rituais de despedida e planejamento do próximo semestre.

Qual foi o fator mais importante a operar a mágica de possibilitar minha reconciliação e prazer em aprender a enveredar com destemor e segurança pela antiga “Jaula de Tigres”?. Qual a mágica que eliminou este antagonismo que o território da informatização sinalizava para mim? É sermos “O povo do meu coração” para a professora Marcia, que teve a mescla exata de competência técnica e acolhimento afetivo que nós, idosos, tanto buscamos, quanto exigimos, perante nossa sede de descobertas.

Nós do grupo dos “Amigos da Caponata” com certeza testemunhamos isso em nosso processo de aprendizagem nesse semestre. A individualizada atenção a cada passo, a cada descoberta neste território, aparentemente tão distante da experiência de idosos e ao mesmo tempo, tão necessário para não nos sentirmos excluídos por nossa idade, foi uma constante no curso oferecido. Em síntese: valeu “Amigos da Caponata”, valeu querida professora Marcia, valeu Sesc. Muito obrigada!




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